O dia sete do mês passado foi especialmente emocionante para
esse corredor metido a blogueiro. Pela primeira vez na vida, eu corri toda a
Volta Internacional da Pampulha na companhia da minha filha.
Se para qualquer pai, passar duas horas junto com a cria já
é motivo de orgulho, para um pai que gosta de correr, passar essas mesmas duas
horas fazendo o que ele mais gosta com quem ele mais gosta - é de arrasar!
Desde que aquela prova acabou, venho pensando em escrever
este post. Até tentei fazer isso na segunda-feira posterior à prova, mas o
texto ficou parecendo aqueles dramas de novela e eu joguei fora. Preferi
esperar um mês, tempo suficiente pra poder registrar a conquista sem excesso de
emotividade (esse blog já é meloso demais da conta).
E hoje cá estou eu, olhando para a tela e me lembrando dos
lugares, das conversas, da paisagem. Escreverei nos intervalos do trabalho para
que, no final do dia de hoje, eu possa deixar registrado o relato daquele que
foi um dos dias memoráveis da minha vidinha.
(pausa pro almoço: comi salada de jiló com tomate e fígado
de boi - parece estranho, mas tava gostoso pra caramba!)
Nem eram seis horas da manhã e a Luíza foi logo entrando no
meu quarto e acordando a gente com um sorriso que misturava alegria com
apreensão. Eu fiz de conta que despertava sonolento (fui bastante
convincente!), mas na verdade já estava acordado desde muito antes, revirando
na cama e imaginando como seria o dia.
Depois de estarmos todos devidamente acordados, subimos pro
café e a conversa fluiu animada e descontraída. Meia hora mais tarde, saíamos
todos de casa em direção à orla - o cachorro no colo da Eneida e as músicas que
a Iza gosta tocando no rádio. Para nossa grata surpresa, a viagem durou menos
de dez minutos. Primeira felicidade: conseguimos estacionar bem perto do local
da largada.
Conforme havíamos combinado, nos encontramos com o Carlos, a
Fernanda e o Tiago. Depois fomos até a tenda da VEM (Assessoria de corredores
Vida em Movimento), onde havíamos marcado com a amiga Tatiana. Finalmente, fiquei
conhecendo o Roberto, treinador da Tati e diretor da VEM. Ele é a simpatia em
forma de gente! Super atencioso e
gentil. Nos fez sentir tão à vontade (mesmo não sendo filiados à VEM) que
ficamos até sem jeito. A Tatiana não poderia ter encontrado um treinador
melhor.
Ficamos algum tempo com eles e então nos dirigimos para a largada.
Quinze minutos antes do início da corrida, entramos no funil e caminhamos em
direção ao meio da multidão de uns 15 mil rostos que estampavam ansiedade nos
minutos que antecediam a partida.
Que mundo pequeno esse em que vivemos! No meio daquele
montão de gente, eis que encontro com o Stefan, com o Miguel (grande amigo do
Blog Baleias) e com mais um amigo. Se houvéssemos marcado encontro, talvez não
conseguíssemos nos achar...
Cinco minutos para a largada. Estávamos bem aonde eu queria:
no meio do bolo! misturados com a multidão de anônimos que, tal como eu e a
Iza, iria fazer o que gostamos de fazer: desafiarmos a nós mesmos. Correr em
busca da satisfação de superar nossos próprios limites, de mostrar pra nós
mesmos o quanto nos sentimos vivos!
O sinal soou forte. Aquela musiquinha do Globo Esporte
começou a tocar num volume super alto e aquilo fez meu corpo arrepiar. A Luíza
olhava pra mim, olhava pro Carlos (super amigo que nos acompanhou no quilômetro
inicial) e sorria igual criança! Percorremos quase um quilômetro até que a
aglomeração diminuísse a ponto de podermos realmente correr.
Víamos gente fantasiada, gente sorrindo, gente séria. Gente
brava, gente alegre. Gente cantando,
gente emburrada. Era gente pra todo lado!
O ritmo lento, por conta do acúmulo de corredores, nos deu a
oportunidade de relaxar e curtir a corrida que, naqueles quilômetros iniciais,
era mais um passeio do que uma prova de superação.
Até que as placas indicativas da quilometragem foram se
sucedendo - e a algazarra dos instantes iniciais foi dando lugar, como em toda
corrida de longa distância, a momentos de introspecção e de reflexão. Pra mim,
essa é uma das melhores partes das corridas.
Nem bem completamos o quarto KM e vimos um corredor sentado
no canto da rua. A prótese que ele usava em uma das pernas havia se soltado e o
sujeito estava desconsolado. Como várias pessoas já estavam ajudando o moço,
decidimos prosseguir correndo.
A primeira metade da prova transcorreu de forma tranquila.
Nós corríamos e conversávamos. Não me lembro de ter me sentido tão bem na
vida...
Até que a placa do décimo quilômetro surgiu. Correr por uma
hora ao redor de tanta gente deixa marca - principalmente em quem vive
experiência pela primeira vez. A Iza sentiu. Ela ficou caladinha, mas dava pra
ver que estava cansada. Eu perguntava: "tudo bem?" - tudo bem, paps!
Menina valente, aquela! Ela havia colocado na cabeça que correria sem parar pra
nada. Como eu já descobri que ela herdou de mim o gene que endurece a cabeça,
fiquei preocupado porque sabia que - assim como eu - a moça até correria com
dor, mas não iria parar facilmente. E assim prosseguimos, um km depois do
outro. Vez ou outra dávamos de cara com um dos fotógrafos da prova, mas mal
olhávamos para a câmera e o cara já havia ficado pra trás (parar jamais!).
Foram duas horas mágicas. Incrivelmente mágicas!
Fantásticas!
Não dá pra colocar isso num texto. Com meus parcos dons
artísticos e meu vocabulário limitado eu não conseguiria expressar em palavras
o sentimento daquela manhã. Seria como tentar explicar o gosto de gengibre pra
quem nunca provou gengibre. Não, nem é isso. É bem mais intenso. Há uma frase
atribuída a Bob Marlei: "Explicar o que eu sinto é quase como tentar
explicar as cores para um cego".
Já pensando que isso seria impossível, eu comprei todas as
fotos que encontrei nos sites. Vou postá-las aqui, porque elas falam mais do
que as linhas desse texto que tentou descrever o indescritível: duas horas e
onze minutos (ah, como eu queria que demorasse mais!) de pura, autêntica e
genuína felicidade.
Se você ler isso, receba meus parabéns, filha! Você sonhou
alto, treinou duro e conseguiu! Agora você já sabe o quão verdadeiro é o dito
que afirma que "tudo que um sonho precisa para ser realizado é de alguém
que acredite que ele possa ser realizado". Eu amo você!
3 comentários:
"Distance sometimes lets you know
who's worth keeping
and who's worth letting go."
Distance might have many meanings...
Parabens pra nos paps, que fomos corajosos o suficiente pra terminar isso juntos, mesmo a pesar de varias vezes desde que resolvemos correr essa corrida ate passarmos daquela chegada eu ter certeza de que não ia conseguir.
Parabéns aos dois. Quem sabe um dia a Letícia anima correr comigo. Vai demorar claro.
É isso o que vale na vida, né?
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